segunda-feira, 31 de março de 2008

Fabricar automóveis em Portugal nunca deu muitos resultados. Apesar das dificuldades, foi no Porto, na década de 30 que a produção de um número reduzido de automóveis acabou por ter algum êxito. Eduardo Ferreirinha idealizou e construiu um veículo de competição baseado na mecânica Ford – o EDFORD. O crescente fervor pelo automobilismo deu origem à transformação de vários modelos em automóveis de competição: o DM de Dionísio Mateu e Elysio de Melo, o Alba, o Olda, o FAP, o Etnerap e o MARLEI.


Este último, foi idealizado e construído por Mário Moreira Leite, um exímio mecânico da cidade do Porto, durante vários anos chefe técnico das oficinas da General Motors, em Vila Nova de Gaia.

Dois anos depois da sua idealização, participou, pela primeira vez, numa corrida de automóveis como piloto, embora já antes tivesse corrido, como mecânico, sentado ao lado de grandes nomes das corridas de automóveis da época.

“Eu era sempre dos que chegava ao fim. Ficava sempre nos primeiros 10 lugares e qualquer carro me servia, eu ia para me distrair.”

Apesar de afirmar que qualquer carro lhe servia Mário Moreira Leite concebeu e construiu um automóvel à sua medida: o MARLEI.

No início dos anos 50 chegou à garagem do agente da General Motors, em Vila Nova de Gaia, uma Opel Olympia Caravan, totalmente destruída por um acidente. Mário Moreira Leite, na altura chefe dos mecânicos nessa oficina, desencadeou o início da construção de um novo automóvel, nas horas vagas, aproveitando peças do destroço.

Qual foi o seu objectivo principal quando decidiu construir o MARLEI?

“Olhe, eu cacei, pesquei, fui piloto da aviação civil, ... construir o MARLEI foi mais uma válvula de escape como outra qualquer. Sempre gostei de
desafios, de resolver coisas difíceis... e valeu o esforço, o carro ficou fantástico! Era impossível virá-lo!”

Mário Leite, fez tudo , desde o desenho até às transformações do chassis, motor e caixa. Aproveitou o chassi, reforçando-o e colocou uma carroçaria em alumínio, feita numa só peça, o que reduziu o peso de forma drástica, apenas 45 kg . 2 pessoas podiam com facilidade levantar a carroçaria do carro. No final o peso não ultrapassava os 580 kg e atingia os 170kms/h.

Ao querer homologar o carro surgiram muitos contratempos o que atrasou a apresentação e inscrição em provas , tendo entretanto aparecido nesta classe carros especiais como os Porsche, Denzel, etc. Apesar de poucas provas ter feito, conseguiu alguns resultados de relevo, tendo sido abandonado pouco depois, já que era difícil competir com carros importados, mais potentes e utilizando mecânicas mais evoluídas.



Algumas características técnicas :

Fabricante Opel reconstruído Marlei – 1954
Modelo Sport 2 lugares
Matrícula EB-16-93
Distância entre eixos 2390 mm
Chassi L 003219
Motor 15-L50-35562
Motor 4 cilindros 1488 cc
Potência 48 cv




O Marlei estreou-se na competição em 1955 no IV Rali ao Porto, um total de 183 quilómetros com saída do Porto passagem por Braga, Barcelos, Viana do Castelo e regresso à Invicta. Terminou esta prova de estreia na 2° posição da 1° classe do Grupo B, demorando 1 hora 33 minutos e 75 segundos a completar a prova.

O Carro causou boa impressão mas não participou em muitas corridas, como explica Barros Rodrigues, autor do livro “Marlei - O Sonho de um Artífice”, …O Marlei apareceu numa época tardia, em que se vislumbrava já um ataque mais cerrado das marcas estrangeiras como a Denzel ou a Porsche, iria, por isso, ter um papel reservado no contexto competitivo.

Mário Moreira Leite, com 88 anos vivia com Júlia Moreira Leite desde os vinte anos. Juntos participaram em dezenas de corridas e de viagens.
Júlia Moreira Leite também correu em muitas provas de perícia e sempre incentivou as outras senhoras a obterem a licença de condução e a correrem também.

A Imaginação de Mário Moreira Leite não se ficou pela construção do MARLEI. É também da sua autoria um cronómetro eléctrico que chegou a ser muito utilizado nas provas de desporto automóvel.
Durante os anos 60 foi ele que trouxe para o norte de Portugal as corridas de Karting. Os primeiros 6 karts que correram em Portugal foram construídos por ele.
Ainda com 86 anos, correu num circuito de Kartings em Braga.

Mário Moreira Leite gostava de ver na televisão as provas de desporto automóvel e torce sempre pelo piloto brasileiro Barrichelo.
“Nunca consegui estar parado… Sempre gostei de desafios…”, repete Mário Moreira Leite.

No início dos anos 50, surge então em Portugal um fenómeno Automobilístico que colocou o nosso país ao mais alto nível do que se fazia então na Europa:

O aparecimento de marcas Portuguesas de Competição capazes de proporcionarem excelentes corridas e bons espectáculos.

Os pequenos veículos de construção nacional constituíram um dos pilares mais importantes da competição automóvel, não só pela presença maciça nos Circuitos, como também pela versatilidade da sua participação nas provas de regularidade, como os Ralis.

Seria de extrema gratificação assistir a corridas com 14 automóveis, em que quatro ou cinco estariam a lutar claramente pela vitória, sendo todos eles de concepção portuguesa!



Nota: Os textos foram em grande parte retirados do "Jornal do Museu dos Transportes e Comunicações", nº1 outubro de 2002